segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Estou envelhecendo


Senhor,

Sabes melhor do que eu que estou envelhecendo 
e que, mais dia menos dia,farei parte dos velhos. 
Guarda-me daquela mania fatal de acreditar 
que é meu dever dizer algo a respeito de tudo e em qualquer ocasião.

Livra-me do desejo obsessivo 
de por ordem nos negócios dos outros. 
Torna-me refletida, mas não ranzinza, 
serviçal, mas não autoritária. 

Acho uma pena não utilizar toda a imensa reserva de sapiência 
que acumulei por longos anos,
mas bem sabes , Senhor,...
faço questão de conservar alguns amigos.

Segura-me quando eu começar a desfiar detalhes que não acabam mais,
dá-me asas para ir direto ao fim. 

Sela meus lábios acerca de minhas mazelas e doenças,
embora essas aumentem sem cessar,
e, com o passar dos anos, me dê certo prazer enumerá-las.

Não me atrevo a pedir-te
que eu chegue até a gostar de ouvir as outras
quando desenrolam a ladainha dos próprios sofrimentos,
mas ajuda-me a suportá-las com paciência.

Não me atrevo a reclamar uma memória melhor,
dá-me porém uma crescente humildade, 
e menos suscetibilidade,
quando a minha memória esbarrar na dos outros.

Ensina-me a gloriosa lição 
de que pode até acontecer que me engane... 

Tome conta de mim.

Não é que eu tenha tanta vontade de ficar santa
(com certos santos é tão difícil ficar junto!)
mas um velho, além de velho amargo, 
é com certeza uma das supremas invenções do diabo.

Faze-me capaz de ver algo de bom
onde menos se espera,
e de reconhecer talentos,
em gente na qual estes não se percebem. 


E dá-me a graça de proclamá-los.

Amén

Oração feita por uma monja inglesa do século XVII

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